quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Viagem de quem vai ficando

E tudo se transformou

A explosão não fez mortos, diziam na rádio, enquanto se preparava para sair.
Só feridos graves e ligeiros, grandes feridas abertas nos corpos e nas almas de quem assistiu ao propagar das chamas.

Tomou depois o café na mesa da cozinha e comeu uma torrada com doce.

Enquanto seguia, no autocarro de sempre, observava um homem, velho, a olhar a paisagem cinzenta como se fossem flores vermelhas. Era evidente a sua vontade de sair dali, tal como era evidente a sua falta de coragem para o fazer. Todos os dias desde que mudara para aquele prédio o via: a mesma cara, no mesmo lugar, o mesmo olhar, cheio de vazio…

Chegou ao destino.

PAUSA.

De regresso a casa, para junto de quem estava à espera, não encontrou o homem velho do costume. O lugar tinha ficado vago. Na esperança de perceber o que ia na alma do homem velho, decidiu sentar-se no banco dele e olhar pela mesma janela.

A mesma paisagem, a mesma cor, sensações diferentes…


Tudo tinha mudado. O homem velho tinha-se libertado de tudo, até do lugar no autocarro.
Agora aquela prisão era sua…

No telejornal repetiu-se a história de explosão. O Benfica tinha empatado. O ministro não caiu. As guerras eram as mesmas. O homem velho tinha sido visto a voar, com asas grandes e plenas, em direcção ao sul.

1 comentário:

Anónimo disse...

Lindo, Tião... "Tu dominas a cena da escrita"!!!
Quando for grande quero escrever como tu, mesmo!!!

Beijinhos,
Helena